domingo, 21 de outubro de 2018

SOLIDÃO


70
SOLIDÃO
O presidente, porém, disse: – Mas, que mal fez ele? E eles mais clamavam, dizendo: – Seja crucificado (MATEUS, 27:23).
À medida que te elevas, monte acima, no desempenho do próprio dever, experimentas a solidão dos cimos e incomensurável tristeza te constringe a alma sensível.
Onde se encontram os que sorriram contigo no parque primaveril da primeira mocidade? Onde pousam os corações que te buscavam o aconchego nas horas de fantasia? Onde se acolhem quantos te partilhavam o pão e o sonho, nas aventuras ridentes do início?
Certo, ficaram...
Ficaram no vale, voejando em círculo estreito, à maneira das borboletas douradas, que se esfacelam ao primeiro contato da menor chama de luz que se lhes descortine à frente.
Em torno de ti, a claridade, mas também o silêncio...
Dentro de ti, a felicidade de saber, mas igualmente a dor de não seres compreendido...
Tua voz grita sem eco e o teu anseio se alonga em vão.
Entretanto, se realmente sobes, que ouvidos te poderiam escutar a grande distância e que coração faminto de calor do vale se abalançaria a entender, de pronto, os teus ideais de altura?
Choras, indagas e sofres...
Contudo, que espécie de renascimento não será doloroso?
A ave, para libertar-se, destrói o berço da casca em que se formou, e a semente, para produzir, sofre a dilaceração na cova desconhecida.
A solidão com o serviço aos semelhantes gera a grandeza.
A rocha que sustenta a planície costuma viver isolada e o Sol que alimenta o mundo inteiro brilha sozinho.
Não te canses de aprender a ciência da elevação.
Lembra-te do Senhor, que escalou o Calvário, de cruz aos ombros feridos. Ninguém o seguiu na morte afrontosa, à exceção de dois malfeitores, constrangidos à punição, em obediência à justiça.
Recorda-te dele e segue...
Não relaciones os bens que já espalhaste.
Confia no infinito Bem que te aguarda.
Não esperes pelos outros, na marcha de sacrifício e engrandecimento. E não olvides que, pelo ministério da redenção que exerceu para todas as criaturas, o divino Amigo dos Homens não somente viveu, lutou e sofreu sozinho, mas também foi perseguido e crucificado.
NOSSA REFLEXÃO
Não deve existir solidão maior que falar e não ser escutado. Faz parte do exercício de aprender e ensinar. Mas ela só será sofrida se não detemos a compreensão de que todos têm o seu momento de aprofundar seus entendimentos da vida. Nem todos possuem, num determinado tempo, a nossa compreensão, que é individual, mas pertencente a um coletivo específico, e que nem sempre está reunido, pois seus membros têm ocupações voltadas para terceiros, em lugares diferentes.
O Cristo viveu a solidão da companhia de seus beneficiados, em vários momentos de sua vida, neste planeta. Contudo, tinha sua mente ligada ao nosso Criador que nos enviou.
Não nos preocupemos em convencer. Lembremos de Jesus. Veio há 2000 anos, e, até hoje, quantos já O compreenderam? Ele não se preocupou em convencer, pois falou por parábolas, deixando suas explicações, para 1853 anos depois, com a vinda do Consolador que Ele prometeu – traduzido no Espiritismo.
Entendamos que a solidão do falar sem ser escutado é um exercício de paciência, indulgência e de respeito ao ritmo do semelhante. Lembremos que, também, nos fizemos de surdos em outros momentos, bem como agora, quando não damos valor às intuições de pessoas mais esclarecidas e até mesmo às inspirações do nosso Anjo da Guarda.
Mas Emmanuel fala de outra solidão que é a do ser se elevar, deixando para trás aqueles com quem conviveu na “infância”. Um afastamento natural, decorrente das mudanças de pensamentos e hábitos ou, mesmo, do comprometimento com tarefas de maior responsabilidade. Se a tarefa é visando o bem comum, que pode ser sacrificial, com possibilidades de sofrimento carnal, com certeza a solidão ocorrerá, mas será sofrível, isto, é, passageira.
Todavia, a solidão buscada pelo sentimento de superioridade deve ser evitada, pois isto denota egoísmo. Ninguém se torna superior se afastando dos que se atrasam em sua evolução. Pelo contrário, devemos nos lembrar do Mito da Caverna, de Platão, e voltar para resgatar os que ficaram para trás. Como nos diz Um Espírito Protetor[1]:

A perfeição está toda, como disse o Cristo, na prática da caridade absoluta; os deveres da caridade alcançam todas as posições sociais, desde o menor até o maior. Nenhuma caridade teria a praticar o homem que vivesse insulado. Unicamente no contato com os seus semelhantes, nas lutas mais árduas é que ele encontra ensejo de praticá-la. Aquele, pois, que se isola priva-se voluntariamente do mais poderoso meio de aperfeiçoar-se; não tendo de pensar senão em si, sua vida é a de um egoísta.
Então, nos elevemos com compreensão de que a elevação pode nos trazer a solidão dos que não nos acompanham. Contudo, o motivo de elevar-se deve ser sempre o de estar disponível a quem deseja fazer o mesmo.
Que Deus nos ajude.
Domício.



[1] Vide em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XVII, Item 10.

2 comentários:

  1. Muito importante as reflexões trazidas neste blog, é um ótimo trabalho. Obrigado. Saúde e Paz! Prof. Wanderley

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Gratidão, Prof Wanderley, pelo comentário!
      Muita paz, alegrias e saúde!

      Excluir